Editorial
Cultura é muito mais do que um conjunto de crenças, costumes e tradições de um determinado grupo social. Em sua grandiosidade, é o fio que une gerações, molda a sociedade e dá sentido à nossa existência. Ela é um espelho que reflete o que somos, o que fomos e, sobretudo, o que desejamos ser. É na troca de saberes, nas manifestações artísticas, nos rituais diários e nas narrativas que se conservam durante o tempo, que encontramos a nossa identidade, em âmbito individual e também coletivo.
A cultura é viva, dinâmica e tem a capacidade de se reinventar. Nos conecta, ensina e nos torna mais conscientes da pluralidade das experiências que coexistem no espaço e tempo. Nos situa enquanto um corpo vivente, movente, em trânsito. Na revista Praça celebramos a cultura em sua amplitude, no tempo expandido que vivemos, no qual o presente se transforma o tempo todo, permeado pelas temporalidades do ser e estar no mundo. Pois, ao final, a cultura é uma potente linguagem, capaz de transcender fronteiras, unir indivíduos e fazer com que, ao olharmos para o outro, possamos enxergar um pouco de nós mesmos.
De acordo com os estudos sobre território do geógrafo Milton Santos, a rede urbana é um fator condicionante na vida das pessoas, para aqueles que não têm o acesso pleno à cidade, como ele descreve: “Há os que nem podem levar ao mercado o que produzem, que desconhecem o destino que vai ter o resultado do próprio trabalho, os que, pobres de recursos, são prisioneiros do lugar, isto é, dos preços e das carências locais. Para estes, a rede urbana é uma realidade onírica, pertence ao domínio do sonho insatisfeito.” (O Espaço do Cidadão, 2014) O acesso à uma condição de vida digna e à cultura são precarizados ao máximo, colocando as pessoas na condição de sobreviventes. É possível ver essa realidade concreta ao sair às ruas. A ausência dos direitos fundamentais e cívicos é um projeto de Estado, das estruturas de poder, junto a um mercado capitalista que visa sempre o lucro.
A população brasileira não supera seu histórico de dominação e colonialismo. Enquanto temos uma maioria proletária, muitas vezes autônomos e sem segurança trabalhista, uma pequena parcela abastada goza de privilégios e lucros, escancarando a nossa pobreza e destituindo o acesso da maioria a ambientes socioculturais de lazer, como os cinemas de rua, ou no projeto de marginalização de cemitérios, como no caso do Bonfim. Quem tem o direito de viver e o de morrer?
O sonho utópico que estrutura a revista Praça flerta, na número 2, com o surrealismo, desde sua origem mais histórica, no movimento literário e artístico que propunha uma desconexão dos modelos tradicionais em Paris na década 1920, buscando enfatizar o papel do inconsciente na atividade criativa. Portanto, esse ofício vem a ser desconstruído e decolonizado por nós, em textos e imagens, propondo uma atualização de processos e conceitos que estruturam uma experiência criativa, alinhada à nossa própria realidade, como no poema Canto de regresso à pátria de Oswald de Andrade “Minha terra tem palmares, Onde gorjeia o mar, Os passarinhos daqui, Não cantam como os de lá” serve de inspiração para a valorização da cultura e da arte que almejamos com a revista.
Ana Luisa Campos
Bruna Mibielli
Luiza Barbosa
NÚCLEO DE EXPERIMENTAÇÃO EM JORNALISMO
O Núcleo de Experimentação em Jornalismo da Faculdade de Comunicação e Artes da PUC Minas está sediado no Campus Lourdes. Idealizado como espaço de experimentação para os alunos da unidade, o seu objetivo é promover o desenvolvimento de produtos no campo do jornalismo cultural. Teve início com a criação da revista Praça, destinada a abrigar reportagens realizadas com maior tempo de investigação e redação, em diálogo com as perspectivas contemporâneas do jornalismo. A formação deste núcleo e de sua revista almeja promover a vocação cultural do curso e estabelecer pontes efetivas entre a universidade e o espaço em que ela está inserida, o Circuito Praça da Liberdade.